08 fevereiro 2007

Referendo de 11 de Fevereiro - orgulhosamente S.O.S.?

Assumo que:
  • O feto não é uma pessoa – sê-lo-á mais tarde, caso se desenvolva normalmente;

  • Ninguém com lucidez pode ser a favor da provocação do aborto sem fundamento, menos ainda como mero método contraceptivo... mas a primeira pessoa a pensar assim é a mulher grávida. E a pergunta do referendo é inteligentemente clara: o que está em causa é a descriminalização (ou não) da mulher que interrompe a gravidez em determinadas condições («técnicas» e de prazo);

  • Ninguém com lucidez pode ser a favor de acusar como criminosa uma mulher que conscientemente não aceita ter um filho e, por isso, interrompe a gravidez nas primeiras semanas de gestação;

  • Insinuar uma «solução» de crime sem pena é uma afronta à dignidade da mulher que interrompe a sua gravidez, como se o carimbo de «criminosa» por si só não fosse relevante. Aliás, basta o julgamento para que a dignidade da mulher seja posta em causa, pela humilhação e pela devassa da sua vida privada a que fica sujeita, como bem alertou Júlio Machado Vaz;

  • A definição de um prazo para legalidade da IVG (10 semanas) é necessária e, pelo que as publicações científicas explanam, parece razoável. Alegar que 10 semanas e um dia já será ilegal é um argumento falacioso («definição de fronteira»). Aliás, o professor Marcelo Rebelo de Sousa também sabe que com 9,5 se passa mas com 9,4 se reprova. É injusto? Talvez, mas não será por isso que um aluno passa com qualquer nota! Ou que alguém poderá insinuar que a masturbação masculina é crime (só a igreja católica tem essa ideia peregrina, mas chama-lhe pecado) porque mata milhões de espermatozóides (que, com os óvulos, são também formas de vida);

  • O homem que provocou a gravidez pode e deve ter uma palavra a dizer mas, havendo posições opostas, a decisão deverá caber à mulher grávida;

  • A igreja católica tem tido algumas posições - ameaças de excomunhão a quem votar «Sim», IVG como pecado mortal gravíssimo, comparação da IVG ao terrorismo ou ao enforcamento do Saddam Hussein,... - que só por si justificam a rejeição de quem tenta ser racional nesta discussão. Recomendo que leiam a primeira encíclica de Bento XVI «Deus Caritas est» (Deus é amor), em que valoriza o amor erótico. Ou a teologia da sexualidade de João Paulo II, que defendia já antes de ser papa que "o homem e a mulher são pessoas iguais em dignidade"(1). Entretanto, não se livram de comentários como este, recebido por e-mail: "Nunca um coxo treinou atletas para a maratona nem um mudo deu aulas de dicção. Só os padres não prescindem de dar conselhos sobre a reprodução e a sexualidade";

  • Os políticos deveriam decidir isto na Assembleia da República. Na praça pública, a argumentação é demasiadas vezes irracional e falaciosa, muitas vezes partindo de quem não tem qualquer autoridade para se pronunciar sobre este tema e gerando uma reacção de enfado por parte de muitas pessoas (levando à abstenção);

  • O aborto clandestino, com todas as suas consequências - incluindo risco de vida para a mulher - não deixará de existir em caso de vitória do «não».
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(1) citado por Yves Semen in «A sexualidade segundo João Paulo II», pág. 40, Princípia Editora, Estoril, 2006

Entretanto, deixo aqui algumas sugestões de leitura... e olhura sobre este tema:
Didas - "Uma História Moderna III", entre outros posts;
Rui Costa Pinto na «Visão» - "Uma questão de consciência";
Gato Fedorento - "Marcelo Rebelo de Sousa e o aborto";
Maria Árvore - "Desvario";
Gotinha - "adivinha";
OrCa - "Janeiras, janeiras... e o referendo";
Controversa maresia - "E que tal contribuir com os meus impostos para...";
Encandescente - "Sou mulher. Digo SIM no referendo sobre o aborto";
Gabriel em TopaTudo;
A Anani recomenda (e muito bem) Rita Ferro Rodrigues no blog sorriso-do-bisturi - "Carminho & Sandra";


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"Já que a questão é dinheiro, que tal analisá-la em todas as vertentes?" - Didas

É certamente uma causa pela qual vale a pena... votar!

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