Como já vos tinha dito, o «Jornal do Fundão» alertou na semana passada para um monumento fálico pré-histórico no Ferro (perto de Caria), que está ao abandono e se arrisca a vir a ser destruído.
A malta da ArqueoBeira já me esclareceu sobre o que há a fazer:
"Realmente é lamentável que um monumento raro como o que temos em presença, se encontre no estado de abandono actual. Em termos de preservação, quem terá de tomar a iniciativa deverão ser as autoridades competentes, pelo que aconselho a que entrem em contacto com a Junta de Freguesia local, Câmara Municipal da Covilhã, e extensão do IPA da Covilhã, dando conta do caso.
Obviamente que o facto de ter sido publicado no JF já lhe terá dado uma boa publicidade mas nunca é demais fazermos o que estiver ao nosso alcance para contribuir para a salvaguarda dos vestígios da nossa história colectiva.
Nós próprios vamos tomar essa iniciativa e como oportunamente salientaram, vamos incluir o monumento no nosso roteiro."
Vamos a isso!
Este monumento fálico não pode ser destruído. A Junta de Freguesia do Ferro só terá a ganhar em preservá-lo e colocá-lo num sítio digno. Mas receio que vença a mentalidade tacanha de quem vê o sexo como pecado.
A apresentar mensagens correspondentes à consulta Monumento fálico Ferro ordenadas por relevância. Ordenar por data Mostrar todas as mensagens
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20 abril 2005
13 abril 2005
Dá Deus falos a quem não tem a funda São!
Vim-me a saber pelo "Jornal do Fundão" que na vila do Ferro, muito perto de Caria, o monumento fálico - único no país - monobloco de granito, que os homens pré-históricos adoraram como símbolo da fecundidade humana, agrícola e pecuária, está neste momento votado ao abandono!
Antes que seja tarde, temos que fazer alguma coisa. Para já, enviei uma mensagem para a ArqueoBeira:
"(...) Verifico que não o têm referenciado no vosso site.
Há algo que possamos fazer para defender este património valiosíssimo? (...)"
Se o Estado pode tomar posse administrativa de propriedade privada em casos de abandono, aqui não poderá acontecer o contrário?
13 setembro 2021
Menires do Rochoso (Guarda) - um alerta pelo Jornal do Fundão e a posição da autarquia
Recentemente, o Jornal do Fundão publicou uma carta de um leitor a alertar para a destruição que ocorreu aos menires do Rochoso.
Escrevi este e-mail para a União de Freguesias do Rochoso e Monte Margarida:
"Li recentemente uma carta enviada por Joaquim Vargas ao Jornal do Fundão e publicada por este jornal, sobre o desleixo e destruição a que estão sujeitos os dois menires no Rochoso.
Esta notícia fez-me recordar um episódio idêntico ocorrido com um monumento fálico no Ferro (Covilhã). A minha intervenção e da Arqueobeira, nessa altura, foi no sentido de alertar e pedir à Junta de Freguesia para tomar medidas para a sua preservação e colocação num local digno. A Junta de Freguesia do Ferro, na altura, respondeu aos nossos apelos e procedeu de uma forma muito correta, no caso reposicionando aquele monumento pré-histórico à fertilidade (como o são os dois menires do Rochoso) no jardim no centro da povoação.
Podem informar o que está a ser feito e/ou previsto para a reconstrução do menir derrubado e partido, assim como para a placa de sinalização?"
A resposta foi rápida e muito positiva:
"No seguimento do email que enviou e que agradecemos, uma vez que demonstra interesse pela causa pública, informamos que esta situação foi prontamente identificada pela União de Freguesias do Rochoso e Monte Margarida, tendo reportada para o Município da Guarda, entidade responsável pelo serviço municipal das águas que originou este dano grave no património da Freguesia. Esta situação foi igualmente reportada para a DRCC - Direcção da Cultura do Centro.
Segundo temos conhecimento esta situação foi analisada pelo Município, tendo já sido avaliada por técnicos do Município, por forma a fazerem a recuperação do Menir.
Com os melhores cumprimentos,
António José Terras Simões
União de Freguesias do Rochoso e Monte Margarida"
Fico muito reconfortada por saber que o assunto está a ser tratado da forma correta, tendo em conta o valor inestimável desse património.
24 junho 2007
O 7º Encontra-a-Funda deixou-me toda molhadinha...
... principalmente à noite, no Sãorau na quinta do Panasco. Como aquilo foi ao ar livre, as pessoas até pensaram que estava um orvalho do... (não me lembro de nada que rime). Mas não. Era mesmo eu, ensopadinha de prazer com tantos mimos e coisas boas que por lá houve.
Eu resumiria o fim de semana da seguinte forma: foi um Encontro do caralho. Vou passar a fundamentar porque é que eu a tenho tese:
Eu já ganhei balanço antes quando descobri uma utilidade complementar ao depósito da água de Caria. Não se admirem se nos próximos dias a água sair das torneiras um pouco viscosa. É que foi um dinheirão ali espalhado em KY Gel, pois como sabem eu sou funda mas não sou larga.
Relembrámos o Penis Migratoris, anjo claramente português (vê-se logo porque tem pêlos debaixo das asas).
O monumento fálico do Ferro proporcionou uma ilusão momentânea de imponência (não confundir com impotência) aos membros que, comparando, ali não passaram de membrinhos...
... e às membranas uma vontade louca de levarem aquilo para suas casas (até porque nem gasta pilhas). Tantos beijinhos e afagos que lhe deram. E este monumento é uma imagem que não perdeu em nada a sua actualidade, pois continua a representar o português: sempre teso!
Na quinta dos Pimpões (que só não sobem mais pontos na minha consideração porque há anos que está no topo) encontramos este belo conjunto escultórico de um homem e de uma mulher...
... sendo que a mulher tinha a rachinha tombada (decerto em combate).
No Restaurante D. Sancho I, em Sortelha (terra que tem um castelo com torre de ménage), onde tivemos um belo almoço de caça e o George Coast (agora rebaptizado de Jorge Gostas de Costas) fez uma demonstração de «entrada triunfal em skate feito com um tapete de Arraiolos», vejam como termina o corrimão das escadas. E depois eu é que sou uma tarada...
Espero que tenham tido todos um bom regresso a casa (inclusivamente o pessoal de Caria, já que ao pé da quinta do Panasco há uma curva manhosa e bebeu-se muito espumante bruto, cerveja e vinho tinto). Bem hajam pela vossa presença e boa disposição. A todos em especial. E vamos começar a pensar no 8º Encontra-a-Funda.
Eu resumiria o fim de semana da seguinte forma: foi um Encontro do caralho. Vou passar a fundamentar porque é que eu a tenho tese:
Eu já ganhei balanço antes quando descobri uma utilidade complementar ao depósito da água de Caria. Não se admirem se nos próximos dias a água sair das torneiras um pouco viscosa. É que foi um dinheirão ali espalhado em KY Gel, pois como sabem eu sou funda mas não sou larga.
Relembrámos o Penis Migratoris, anjo claramente português (vê-se logo porque tem pêlos debaixo das asas).
O monumento fálico do Ferro proporcionou uma ilusão momentânea de imponência (não confundir com impotência) aos membros que, comparando, ali não passaram de membrinhos...
... e às membranas uma vontade louca de levarem aquilo para suas casas (até porque nem gasta pilhas). Tantos beijinhos e afagos que lhe deram. E este monumento é uma imagem que não perdeu em nada a sua actualidade, pois continua a representar o português: sempre teso!
Na quinta dos Pimpões (que só não sobem mais pontos na minha consideração porque há anos que está no topo) encontramos este belo conjunto escultórico de um homem e de uma mulher...
... sendo que a mulher tinha a rachinha tombada (decerto em combate).
No Restaurante D. Sancho I, em Sortelha (terra que tem um castelo com torre de ménage), onde tivemos um belo almoço de caça e o George Coast (agora rebaptizado de Jorge Gostas de Costas) fez uma demonstração de «entrada triunfal em skate feito com um tapete de Arraiolos», vejam como termina o corrimão das escadas. E depois eu é que sou uma tarada...
Espero que tenham tido todos um bom regresso a casa (inclusivamente o pessoal de Caria, já que ao pé da quinta do Panasco há uma curva manhosa e bebeu-se muito espumante bruto, cerveja e vinho tinto). Bem hajam pela vossa presença e boa disposição. A todos em especial. E vamos começar a pensar no 8º Encontra-a-Funda.
14 maio 2005
Alguém sabe o que se passa com o monumento fálico do Ferro?
22 junho 2007
61 pessoas vão conviver e divertir-se ao 7º Encontra-a-Funda
Quem não pode ir imagine-nos amanhã à noite, numa quinta por trás da serra da Estrela, depois de um passeio a Centum Cellas, à prova de vinhos na Quinta dos Termos, à jeropiga branca fresquinha do Pielas e ao monumento fálico do Ferro. Com explicações a sério pelo David Caetano da Arqueobeira e à moda da funda São pelo Dom OrCa.
Após um piquenique em que iremos provar petiscos e bebidas de quase todo o país, teremos o Sãorau, com poesias eróticas da Encandescente, do OrCa e do Pedro Laranjeira, algumas delas musicadas e coreografadas pela Tuna Meliches, que nos presenteará com uma sessão de karalhoke e com o que esperamos ser o momento alto da noite: a peça de teatro «Auto das Danações», do nosso amigo e mestre Dom OrCa. E quem melhor que ele para nos explicar o que é esta piç... peça?
Já repararam na capa do «Auto das Danações»? Aquilo é «a funda ediSão» especial da colecção de literatura de cordel que os nossos amigos da Apenas Livros prepararam para o 7º Encontra-a-Funda e vai lá estar disponível à venda. É muita pinta, Noé? Quem quiser comprar este livro e não puder ir lá, é só mandar-me um e-mail. E lá haverá brindes malandrecos oferecidos pela malta fixe da Erosfarma. Eles estão na ExpoFoda, que começou ontem (para quem quer saber notícias do Salão Erótico, a Matahary sugere que leiam a crónica do primeiro dia no Correio da Manhã, mas no Diário de Notícias também encontram mais alguma informação).
Após um piquenique em que iremos provar petiscos e bebidas de quase todo o país, teremos o Sãorau, com poesias eróticas da Encandescente, do OrCa e do Pedro Laranjeira, algumas delas musicadas e coreografadas pela Tuna Meliches, que nos presenteará com uma sessão de karalhoke e com o que esperamos ser o momento alto da noite: a peça de teatro «Auto das Danações», do nosso amigo e mestre Dom OrCa. E quem melhor que ele para nos explicar o que é esta piç... peça?
Já repararam na capa do «Auto das Danações»? Aquilo é «a funda ediSão» especial da colecção de literatura de cordel que os nossos amigos da Apenas Livros prepararam para o 7º Encontra-a-Funda e vai lá estar disponível à venda. É muita pinta, Noé? Quem quiser comprar este livro e não puder ir lá, é só mandar-me um e-mail. E lá haverá brindes malandrecos oferecidos pela malta fixe da Erosfarma. Eles estão na ExpoFoda, que começou ontem (para quem quer saber notícias do Salão Erótico, a Matahary sugere que leiam a crónica do primeiro dia no Correio da Manhã, mas no Diário de Notícias também encontram mais alguma informação).
10 agosto 2022
Postalinho da Beira (bem) Alta
"Menir do Vale Maria Pais, em Penedono."
Excerto de artigo da página PortugalNotavel.com:
Lurdes Silva
"O Menir Vale Maria Pais foi encontrado em 1991 e encontrava-se fragmentado em duas partes. É um monumento fálico, bem afeiçoado com “fossetes”, as tais Covinhas e decorado com uma representação solar radiada. Possui três metros de altura. A disposição dos motivos decorativos faz supor que originalmente medisse entre 5 a 6 metros. Este menir é um dos mais notáveis do nosso território e, a norte do rio Tejo, não encontra rival. É uma pedra mágica na paisagem. E em redor desta pedra mágica, num exemplo puro de litolatria, foram surgindo outras formas de vivenciar o transcendente: um possível santuário rupestre, da idade do Bronze ou mesmo da idade do Ferro e posteriormente uma necrópole com várias sepulturas rupestres, construídas algures entre os séculos VII e XII. Todo este espaço, tem semelhança com a Necrópole de São Gens, em Celorico da Beira, porque as sepulturas rupestres espalham-se em redor da Pedra, como se esta pela sua forma inusitada, fosse um imã de atracção telúrica e tivesse uma função psicopômbica para os nossos ancestrais dado que em seu redor foram construídas necrópoles com sepulturas antropomórficas. E pela sua espetacularidade, estas pedras ainda são motivo de atração para os turistas."
04 novembro 2007
Uma erecção de 6.000 anos
O nosso Fundidor Pedro Laranjeira fez, no número que saiu ontem da revista Perspectiva, de que é director editorial, várias homenagens num só artigo: ao monumento fálico do Ferro, ao 7º Encontra-a-Funda e às mulheres, que sabem dar valor ao que é bom.
a notícia
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09 julho 2015
«Desvirtudes da ventura» - António Eça de Queiroz
Valdemira Gomes do Ó – ou Mirita, como todos a conheciam em Tagilde, onde geria com pulso de ferro um mini-mercado com tasca associada – atravessou a ponte sobre o Tâmega em direcção à bela Igreja de S. Gonçalo, onde entrou animada de plano concreto. Já dentro do rico templo procurou a pequena capela do santo, que à hora do almoço não apresentava grande movimento – apesar daquele primeiro domingo de Junho ser a sua festa anual.
Junto ao túmulo de calcário polícromo apenas duas mulheres rezavam, tocando o monumento umas vezes com as mãos, outras com a cabeça.
Mirita esperou, de joelhos no chão.
A seu lado, no interior de um saco colorido feito em espesso tecido bordado com motivos florais, descansava um outro saco de plástico transparente bem cheio de Doces do Santo – uma espécie de cavacas de Resende de formato inequivocamente fálico. Ela e o marido iriam nos dias mais próximos ter por sobremesa exclusiva os conhecidos ‘Caralhos de S. Gonçalo’.
Mas faltava o principal, de acordo com os conselhos da mulher de saber que consultara há duas semanas na Portela do Gove: devia esfregar a testa do corpo no túmulo do santo, mas sem qualquer roupa em cima…
Por isso viera sem cuecas.
Restava aguardar o momento em que a capela não tivesse ninguém: então iria erguer a saia, esfregando de seguida a felpuda intimidade no calcário pintado que cobria e alindava o túmulo do santo padroeiro de casadoiras e inférteis de longo curso.
Finalmente o momento chegou.
Ninguém à vista!
Mirita levantou a saia, que escolhera larga e apropriada à ousada manobra, e, cheia de cuidados, esfregou uma e outra vez a testa do sexo no vértice já um pouco gasto do velho túmulo – ao mesmo tempo que murmurava a ladainha que a Bruxa de Eiriz, como era conhecida a sua mulher de saber, lhe indicara por conveniente.
Na sua devoção paroxística nem deu pela aproximação de uma outra mulher, bem mais velha, que a assustou com um comentário trocista:
– Ó santinha…, deixe-se lá disso, carago… Olhe que não vão ser essas esfregadelas que a vão ajudar, isso é garantido…
Mirita, que baixara num repente o largo vestido e se apressava a ganhar alguma compostura no meio de uma coradela que não enganava ninguém, apressou-se a ripostar uma quase irada e gaguejante pergunta:
– E quem é você para saber se funciona ou não?…
– Sou parteira diplomada, Genoveva Pires ao seu dispor… Mas diga-me só uma coisa: já fez algum teste de fertilidade?…
– Já fiz sim senhora!, e o doutor disse que eu não tinha nada estragado…
Então a diplomada Genoveva pediu-lhe para a acompanhar para fora da igreja, pois tinha algo de muito importante para lhe dizer.
Já cá fora, no parque lateral ao convento, mesmo em frente ao Museu Amadeo de Souza-Cardoso, as duas encontraram poiso calmo e relativamente distante de ouvidos alheios.
Genoveva Pires foi direita ao assunto:
– Minha santinha, se você não tem nada estragado… então quem está estragado é o seu homem. Ele porta-se bem no serviço?…
Que sim, que era um animal completo, que não a deixava em paz noite nenhuma… A não ser quando apanhava grossa carraspana. E acusava-a de não lhe dar filhos, um que fosse, e ela que bem queria, pois seria maneira dele a deixar em paz por uns tempos, ao menos…
– Então é porque tem os leites estragados…, disse a diplomada em tom professoral.
Que não podia ser, que nem lho poderia dizer, que a matava, que lhe fugiria – lamentava-se Valdemira Gomes do Ó, com lágrimas fáceis a inflamar-lhe já as vistas.
O conselho da diplomada parteira chegou seco e pesado com um relâmpago do estio:
– Arranje outro macho para o serviço… Mas longe daqui, que não seja conhecido… E faça a parte de comer os doces, e diga ao seu homem que veio à igreja esfregar-se, que ele assim achará que foi mesmo milagre…
Da imediata reacção furiosa de Mirita resultou o fim da entrevista, com a parteira Genoveva a bater em retirada no meio de comentários pouco abonatórios à inteligência da putativa mãe frustrada.
À falta de melhor, a gerente comercial de Tagilde voltou à igreja em busca de consolo no confessionário.
Cinco meses se passaram, assim como muita água do Tâmega correu por baixo da velha testemunha granítica de napoleónicos esforços e galopes liberais ou absolutistas.
Num início de tarde outonal, Valdemira do Ó saía do restaurante ‘Zé da Calçada’ apoderada do braço de um homem atarracado que se esforçava, de forma quase hostil para terceiros, por protegê-la de qualquer encontrão do muito povo que animava as ruas. A protuberância ventral que Mirita exibia não deixava dúvidas: estava grávida, muitíssimo grávida!…
O casal encaminhou-se para uma Toyota Hiace, onde o homem, com cuidado extremo, ajudou a mulher a subir e a instalar-se comodamente no lugar do passageiro. Depois, ligando o rádio e beijando-a com carinho evidente, rumou à Igreja de S. Gonçalo.
Mirita cabeceava de sono quando um leve toque no vidro da Hiace a fez despertar para uma incómoda realidade: do outro lado, com um sorriso de frincha negra, a parteira diplomada fez-lhe sinal para descer o vidro.
Não querendo escândalo, a gerente comercial de Tagilde lá acedeu em descer o vidro, para de imediato ouvir um sonoro «Ahhh!…».
– É, respondeu Mirita secamente.
– E?…, perguntou a parteira Genoveva.
– Oh!…, não lho vou dizer, carago…
– Diga-me só se é de longe, minha filha. Não lhe quero mal nenhum, e por isso é que lhe pergunto se não é daqui… Porque, veja bem, se for daqui e tiver mais filhos, ainda pode acontecer uma coisa que você nunca quereria… Imagine que tem uma menina e ela, daqui a 20 anos, se apaixona por um meio-irmão que não conhece?…
– Bem…, começou a medo a futura mãe, ele não é daqui mas tem vivido por aqui…
– Eu sei tudo sobre os pais e os filhos desta cidade e arredores…, bem, de quase todos… Diga-me só quem é, para sabermos se há algum risco. Pela minha honra que nunca falarei no assunto…
Mirita corou como uma romã madura e bem aberta, antes de garantir que não havia perigo nenhum:
– … É o padre…
Genoveva Pires deitou por momentos as mãos à cara, antes de declarar o seu espanto:
– Ai então não há perigo por ser o padre?!… Pois olhe que agora é que o perigo é grande, mulher!… É que eu nem lhe conheço os filhos todos, carago…
Eu bem lhe disse que isso era para se fazer longe daqui, santinha!…
A conversa desfez-se ali, o vidro subiu lentamente, com o mesmo vagar com que a diplomada se afastava da Hiace.
O atarracado marido regressava, de sorriso estampado no rosto.
De longe ainda, apontou para um transparente saco repleto de ‘Caralhos de S. Gonçalo’.
Ao entrar no furgão anunciou com felicidade evidente:
– Hoje até me confessei!…
António Eça de Queiroz
Blog Escrever é triste
09 janeiro 2017
«Desvirtudes da ventura» - António Eça de Queiroz
Valdemira Gomes do Ó – ou Mirita, como todos a conheciam em Tagilde, onde geria com pulso de ferro um mini-mercado com tasca associada – atravessou a ponte sobre o Tâmega em direcção à bela Igreja de S. Gonçalo, onde entrou animada de plano concreto. Já dentro do rico templo procurou a pequena capela do santo, que à hora do almoço não apresentava grande movimento – apesar daquele primeiro domingo de Junho ser a sua festa anual.
Junto ao túmulo de calcário polícromo apenas duas mulheres rezavam, tocando o monumento umas vezes com as mãos, outras com a cabeça.
Mirita esperou, de joelhos no chão.
A seu lado, no interior de um saco colorido feito em espesso tecido bordado com motivos florais, descansava um outro saco de plástico transparente bem cheio de Doces do Santo – uma espécie de cavacas de Resende de formato inequivocamente fálico. Ela e o marido iriam nos dias mais próximos ter por sobremesa exclusiva os conhecidos ‘Caralhos de S. Gonçalo’.
Mas faltava o principal, de acordo com os conselhos da mulher de saber que consultara há duas semanas na Portela do Gove: devia esfregar a testa do corpo no túmulo do santo, mas sem qualquer roupa em cima…
Por isso viera sem cuecas.
Restava aguardar o momento em que a capela não tivesse ninguém: então iria erguer a saia, esfregando de seguida a felpuda intimidade no calcário pintado que cobria e alindava o túmulo do santo padroeiro de casadoiras e inférteis de longo curso.
Finalmente o momento chegou.
Ninguém à vista!
Mirita levantou a saia, que escolhera larga e apropriada à ousada manobra, e, cheia de cuidados, esfregou uma e outra vez a testa do sexo no vértice já um pouco gasto do velho túmulo – ao mesmo tempo que murmurava a ladainha que a Bruxa de Eiriz, como era conhecida a sua mulher de saber, lhe indicara por conveniente.
Na sua devoção paroxística nem deu pela aproximação de uma outra mulher, bem mais velha, que a assustou com um comentário trocista:
– Ó santinha…, deixe-se lá disso, carago… Olhe que não vão ser essas esfregadelas que a vão ajudar, isso é garantido…
Mirita, que baixara num repente o largo vestido e se apressava a ganhar alguma compostura no meio de uma coradela que não enganava ninguém, apressou-se a ripostar uma quase irada e gaguejante pergunta:
– E quem é você para saber se funciona ou não?…
– Sou parteira diplomada, Genoveva Pires ao seu dispor… Mas diga-me só uma coisa: já fez algum teste de fertilidade?…
– Já fiz sim senhora!, e o doutor disse que eu não tinha nada estragado…
Então a diplomada Genoveva pediu-lhe para a acompanhar para fora da igreja, pois tinha algo de muito importante para lhe dizer.
Já cá fora, no parque lateral ao convento, mesmo em frente ao Museu Amadeo de Souza-Cardoso, as duas encontraram poiso calmo e relativamente distante de ouvidos alheios.
Genoveva Pires foi direita ao assunto:
– Minha santinha, se você não tem nada estragado… então quem está estragado é o seu homem. Ele porta-se bem no serviço?…
Que sim, que era um animal completo, que não a deixava em paz noite nenhuma… A não ser quando apanhava grossa carraspana. E acusava-a de não lhe dar filhos, um que fosse, e ela que bem queria, pois seria maneira dele a deixar em paz por uns tempos, ao menos…
– Então é porque tem os leites estragados…, disse a diplomada em tom professoral.
Que não podia ser, que nem lho poderia dizer, que a matava, que lhe fugiria – lamentava-se Valdemira Gomes do Ó, com lágrimas fáceis a inflamar-lhe já as vistas.
O conselho da diplomada parteira chegou seco e pesado com um relâmpago do estio:
– Arranje outro macho para o serviço… Mas longe daqui, que não seja conhecido… E faça a parte de comer os doces, e diga ao seu homem que veio à igreja esfregar-se, que ele assim achará que foi mesmo milagre…
Da imediata reacção furiosa de Mirita resultou o fim da entrevista, com a parteira Genoveva a bater em retirada no meio de comentários pouco abonatórios à inteligência da putativa mãe frustrada.
À falta de melhor, a gerente comercial de Tagilde voltou à igreja em busca de consolo no confessionário.
Cinco meses se passaram, assim como muita água do Tâmega correu por baixo da velha testemunha granítica de napoleónicos esforços e galopes liberais ou absolutistas.
Num início de tarde outonal, Valdemira do Ó saía do restaurante ‘Zé da Calçada’ apoderada do braço de um homem atarracado que se esforçava, de forma quase hostil para terceiros, por protegê-la de qualquer encontrão do muito povo que animava as ruas. A protuberância ventral que Mirita exibia não deixava dúvidas: estava grávida, muitíssimo grávida!…
O casal encaminhou-se para uma Toyota Hiace, onde o homem, com cuidado extremo, ajudou a mulher a subir e a instalar-se comodamente no lugar do passageiro. Depois, ligando o rádio e beijando-a com carinho evidente, rumou à Igreja de S. Gonçalo.
Mirita cabeceava de sono quando um leve toque no vidro da Hiace a fez despertar para uma incómoda realidade: do outro lado, com um sorriso de frincha negra, a parteira diplomada fez-lhe sinal para descer o vidro.
Não querendo escândalo, a gerente comercial de Tagilde lá acedeu em descer o vidro, para de imediato ouvir um sonoro «Ahhh!…».
– É, respondeu Mirita secamente.
– E?…, perguntou a parteira Genoveva.
– Oh!…, não lho vou dizer, carago…
– Diga-me só se é de longe, minha filha. Não lhe quero mal nenhum, e por isso é que lhe pergunto se não é daqui… Porque, veja bem, se for daqui e tiver mais filhos, ainda pode acontecer uma coisa que você nunca quereria… Imagine que tem uma menina e ela, daqui a 20 anos, se apaixona por um meio-irmão que não conhece?…
– Bem…, começou a medo a futura mãe, ele não é daqui mas tem vivido por aqui…
– Eu sei tudo sobre os pais e os filhos desta cidade e arredores…, bem, de quase todos… Diga-me só quem é, para sabermos se há algum risco. Pela minha honra que nunca falarei no assunto…
Mirita corou como uma romã madura e bem aberta, antes de garantir que não havia perigo nenhum:
– … É o padre…
Genoveva Pires deitou por momentos as mãos à cara, antes de declarar o seu espanto:
– Ai então não há perigo por ser o padre?!… Pois olhe que agora é que o perigo é grande, mulher!… É que eu nem lhe conheço os filhos todos, carago…
Eu bem lhe disse que isso era para se fazer longe daqui, santinha!…
A conversa desfez-se ali, o vidro subiu lentamente, com o mesmo vagar com que a diplomada se afastava da Hiace.
O atarracado marido regressava, de sorriso estampado no rosto.
De longe ainda, apontou para um transparente saco repleto de ‘Caralhos de S. Gonçalo’.
Ao entrar no furgão anunciou com felicidade evidente:
– Hoje até me confessei!…
António Eça de Queiroz
Mini-conto incluído no livro «Dias de riso e impiedade» (Amazon, 2015) e reproduzido do blog «Escrever é triste» com permisSão do autor
Junto ao túmulo de calcário polícromo apenas duas mulheres rezavam, tocando o monumento umas vezes com as mãos, outras com a cabeça.
Mirita esperou, de joelhos no chão.
A seu lado, no interior de um saco colorido feito em espesso tecido bordado com motivos florais, descansava um outro saco de plástico transparente bem cheio de Doces do Santo – uma espécie de cavacas de Resende de formato inequivocamente fálico. Ela e o marido iriam nos dias mais próximos ter por sobremesa exclusiva os conhecidos ‘Caralhos de S. Gonçalo’.
Mas faltava o principal, de acordo com os conselhos da mulher de saber que consultara há duas semanas na Portela do Gove: devia esfregar a testa do corpo no túmulo do santo, mas sem qualquer roupa em cima…
Por isso viera sem cuecas.
Restava aguardar o momento em que a capela não tivesse ninguém: então iria erguer a saia, esfregando de seguida a felpuda intimidade no calcário pintado que cobria e alindava o túmulo do santo padroeiro de casadoiras e inférteis de longo curso.
Finalmente o momento chegou.
Ninguém à vista!
Mirita levantou a saia, que escolhera larga e apropriada à ousada manobra, e, cheia de cuidados, esfregou uma e outra vez a testa do sexo no vértice já um pouco gasto do velho túmulo – ao mesmo tempo que murmurava a ladainha que a Bruxa de Eiriz, como era conhecida a sua mulher de saber, lhe indicara por conveniente.
Na sua devoção paroxística nem deu pela aproximação de uma outra mulher, bem mais velha, que a assustou com um comentário trocista:
– Ó santinha…, deixe-se lá disso, carago… Olhe que não vão ser essas esfregadelas que a vão ajudar, isso é garantido…
Mirita, que baixara num repente o largo vestido e se apressava a ganhar alguma compostura no meio de uma coradela que não enganava ninguém, apressou-se a ripostar uma quase irada e gaguejante pergunta:
– E quem é você para saber se funciona ou não?…
– Sou parteira diplomada, Genoveva Pires ao seu dispor… Mas diga-me só uma coisa: já fez algum teste de fertilidade?…
– Já fiz sim senhora!, e o doutor disse que eu não tinha nada estragado…
Então a diplomada Genoveva pediu-lhe para a acompanhar para fora da igreja, pois tinha algo de muito importante para lhe dizer.
Já cá fora, no parque lateral ao convento, mesmo em frente ao Museu Amadeo de Souza-Cardoso, as duas encontraram poiso calmo e relativamente distante de ouvidos alheios.
Genoveva Pires foi direita ao assunto:
– Minha santinha, se você não tem nada estragado… então quem está estragado é o seu homem. Ele porta-se bem no serviço?…
Que sim, que era um animal completo, que não a deixava em paz noite nenhuma… A não ser quando apanhava grossa carraspana. E acusava-a de não lhe dar filhos, um que fosse, e ela que bem queria, pois seria maneira dele a deixar em paz por uns tempos, ao menos…
– Então é porque tem os leites estragados…, disse a diplomada em tom professoral.
Que não podia ser, que nem lho poderia dizer, que a matava, que lhe fugiria – lamentava-se Valdemira Gomes do Ó, com lágrimas fáceis a inflamar-lhe já as vistas.
O conselho da diplomada parteira chegou seco e pesado com um relâmpago do estio:
– Arranje outro macho para o serviço… Mas longe daqui, que não seja conhecido… E faça a parte de comer os doces, e diga ao seu homem que veio à igreja esfregar-se, que ele assim achará que foi mesmo milagre…
Da imediata reacção furiosa de Mirita resultou o fim da entrevista, com a parteira Genoveva a bater em retirada no meio de comentários pouco abonatórios à inteligência da putativa mãe frustrada.
À falta de melhor, a gerente comercial de Tagilde voltou à igreja em busca de consolo no confessionário.
Cinco meses se passaram, assim como muita água do Tâmega correu por baixo da velha testemunha granítica de napoleónicos esforços e galopes liberais ou absolutistas.
Num início de tarde outonal, Valdemira do Ó saía do restaurante ‘Zé da Calçada’ apoderada do braço de um homem atarracado que se esforçava, de forma quase hostil para terceiros, por protegê-la de qualquer encontrão do muito povo que animava as ruas. A protuberância ventral que Mirita exibia não deixava dúvidas: estava grávida, muitíssimo grávida!…
O casal encaminhou-se para uma Toyota Hiace, onde o homem, com cuidado extremo, ajudou a mulher a subir e a instalar-se comodamente no lugar do passageiro. Depois, ligando o rádio e beijando-a com carinho evidente, rumou à Igreja de S. Gonçalo.
Mirita cabeceava de sono quando um leve toque no vidro da Hiace a fez despertar para uma incómoda realidade: do outro lado, com um sorriso de frincha negra, a parteira diplomada fez-lhe sinal para descer o vidro.
Não querendo escândalo, a gerente comercial de Tagilde lá acedeu em descer o vidro, para de imediato ouvir um sonoro «Ahhh!…».
– É, respondeu Mirita secamente.
– E?…, perguntou a parteira Genoveva.
– Oh!…, não lho vou dizer, carago…
– Diga-me só se é de longe, minha filha. Não lhe quero mal nenhum, e por isso é que lhe pergunto se não é daqui… Porque, veja bem, se for daqui e tiver mais filhos, ainda pode acontecer uma coisa que você nunca quereria… Imagine que tem uma menina e ela, daqui a 20 anos, se apaixona por um meio-irmão que não conhece?…
– Bem…, começou a medo a futura mãe, ele não é daqui mas tem vivido por aqui…
– Eu sei tudo sobre os pais e os filhos desta cidade e arredores…, bem, de quase todos… Diga-me só quem é, para sabermos se há algum risco. Pela minha honra que nunca falarei no assunto…
Mirita corou como uma romã madura e bem aberta, antes de garantir que não havia perigo nenhum:
– … É o padre…
Genoveva Pires deitou por momentos as mãos à cara, antes de declarar o seu espanto:
– Ai então não há perigo por ser o padre?!… Pois olhe que agora é que o perigo é grande, mulher!… É que eu nem lhe conheço os filhos todos, carago…
Eu bem lhe disse que isso era para se fazer longe daqui, santinha!…
A conversa desfez-se ali, o vidro subiu lentamente, com o mesmo vagar com que a diplomada se afastava da Hiace.
O atarracado marido regressava, de sorriso estampado no rosto.
De longe ainda, apontou para um transparente saco repleto de ‘Caralhos de S. Gonçalo’.
Ao entrar no furgão anunciou com felicidade evidente:
– Hoje até me confessei!…
António Eça de Queiroz
Mini-conto incluído no livro «Dias de riso e impiedade» (Amazon, 2015) e reproduzido do blog «Escrever é triste» com permisSão do autor
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